Machado de Assis, em adorável inspiração, assim dispõe no poema que deu título ao presente ensaio, Luz entre Sombras:
É noite medonha e escura,
Muda como o passamento*
Uma só no firmamento
Trêmula estrela fulgura.
Fala aos ecos da espessura
A chorosa harpa do vento,
E num canto sonolento
Entre as árvores murmura.
Noite que assombra a memória,
Noite que os medos convida,
Erma, triste, merencória.
No entanto...minha alma olvida
Dor que se transforma em glória,
Morte que se rompe em vida.
Machado de Assis, in 'Falenas'
A leitura deste poema trouxe à mente o quanto precisamos estar atentos e também acolhermos os momentos de luz e sombras (e entre sombras também) em nossa vida.
Quando iniciamos a Caminhada Mágica, seja ela em que (quais) sistema(s) se escolha trilhar, passamos por momentos de luz e sombras, morte e renascimento, situação que é pouco compreendida por quem não segue uma caminhada espiritual.
Alguns acham que tudo deveria dar sempre certo, afinal, estamos em um caminho espiritual, não é mesmo?
Apenas quem sobrevive às inúmeras noites escuras da alma entenderá essa estranha roda do destino, que quanto mais escalamos em subida, maior abrupta e forte é a queda - ou, em outras palavras, as rasteiras que damos em nós mesmos (e que culpamos a vida).
Em um determinado momento sentimos um chamado, um convite, uma necessidade de sondarmos os mistérios da Terra e dos Céus, de voltar para casa (a verdadeira), reconectarmos à nossa verdadeira essência.
É um momento especial, em que parece que tudo faz sentido.
E, no meio de tanta beleza, recebemos o lampejo falacioso da iluminação, no qual temos toda a força de vontade, intrepidez, coragem e fé - atributos indispensáveis para aqueles que buscam a consecução da Grande Obra.
Há uma necessidade de saber tudo, ler tudo... afinal, é um novo Universo que está desabrochando.
Mas será essa a verdadeira iluminação?
Não posso afirmar, aliás, o que cada um pensa a respeito de si mesmo é isso, e nada mais: o seu ponto de vista. Mas a trajetória de mais de treze anos permite algumas constatações.
Aliás, aqui, um parêntese: a iluminação não é um fim a se alcançar, afinal, não estamos apegados aos resultados: o que vale é a experiência!
Voltando ao tema da iluminação... muitas vezes, sem orientação, alguns vagam perdidos no meio de suas próprias alucinações mágicas (no qual pode ver, sentir e ouvir "coisas"), e a exigência de disciplina que a caminhada traz acaba afastando o então candidato a iniciado de um real e científico caminho de descobertas e evolução espiritual.
Afinal, se ele estudou tanto e tantas coisas, por que precisa aprender o básico?
Em outros casos, quer converter a todos (assim como em outras religiões), porque algo que é tão bom e libertador não pode ser reservado a poucos... e é então que a exigência do silêncio e discrição é colocada à prova. E muitos, neste ponto, também falham...
Inesperadamente, embora previsivelmente, começam a surgir as sombras... as suas próprias e também as do Caminho (porque sim, trilhar a senda mágica traz muitos obstáculos e desafios): tudo o que era lindo e maravilhoso passa a ser difícil, árido, incompreensível, e - até - absurdo.
Os de pouca fé logo abandonam o barco... afinal, o que é que vieram fazer ali mesmo? Já nem sabem mais.
Os persistentes permanecem um pouco mais... mais por teimosia do que outra coisa. Arrastam-se meses e até anos, tentando convencer a si mesmos de que é o seu caminho... mas sofrem, em silêncio e terror, em sua eterna noite escura da alma... definitivamente, aquele não é o seu caminho. Afinal, existem tantos outros...
Mas aqueles de coração ardente e alma resoluta, totalmente dedicados à Grande Obra, estes permanecem, e são os pilares que constituem os alicerces da Tradição.
Para esses, toda morte é um convite ao renascimento, e cada renascer é um momento de reafirmação da sua missão, como estrelas da grande Dança Cósmica da vida.
Entre luz e sombras caminhamos, com fé, coragem e vontade. E, como disse o poeta,
"No entanto...minha alma olvida
Dor que se transforma em glória,
Morte que se rompe em vida."
Evoé!
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